MITOS AFRICANOS



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Oxossi, o caçador de uma flecha só

Olofin era um rei africano da terra de Ifé. Cada ano, na época da colheita, Olofin comemorava, em seu reino, a Festa dos Inhames. Ninguém podia comer dos novos inhames antes da festa.
Chegado o dia, o rei instalava-se no pátio do seu palácio.Suas mulheres sentavam-se à sua direita. Seus ministros sentavam-se à sua esquerda. As pessoas reunidas comiam inhame pilado e bebiam vinho de palma.Elas comemoravam e brincavam.
De repente, um enorme pássaro voou sobre a festa.O pássaro voava à direita e voava à esquerda... Até que veio pousar sobre o teto do palácio. O pássaro causava espanto a todos. Era tão grande que o rei pensou ser uma nuvem cobrindo a cidade. Sua asa direita cobria o lado esquerdo do palácio. Sua asa esquerda cobria o lado direito do palácio. As penas do seu rabo varriam o quintal. E sua cabeça cobria o portal da entrada.
As pessoas, assustadas, comentavam:
— Ah! Que esquisita surpresa!
— Eh! De onde veio este desmancha-prazer?
— Como vamos nos livrar dele?—
Vamos, rápido, chamar os caçadores mais hábeis do reino.Trouxeram o “caçador das vinte flechas”.Ele lançou as vinte flechas, mas nenhuma atingiu o grande pássaro.
O rei mandou prender. Trouxeram o “caçador das quarenta flechas”. Ele lançou as quarenta flechas, mas nenhuma atingiu o pássaro.O rei mandou prender.Apresentou-se o “caçador das cinqüenta flechas”. Lançou suas cinqüenta flechas, e nenhuma atingiu o pássaro.O rei mandou prender.
Finalmente, apresentou-se o “caçador de uma só flecha”. A mãe desse caçador não tinha outros filhos; foi rapidamente consultar o babalaô e saber o que fazer para ajudar seu único filho. O babalaô ensinou-lhe um ebó e umas palavras “bem fortes”. Ela devia dizer três vezes: “Que o peito do pássaro aceite este presente”.Isso foi dito no momento exato em que o caçador atirava sua única flecha. A flecha atingiu o pássaro em pleno peito. O pássaro caiu pesadamente, debateu-se e morreu.
A notícia se espalhou: — Foi Oxóssi, o caçador de uma só flecha, quem matou o pássaro!
O rei deu como recompensa a metade de seu reino. Os três caçadores foram soltos da prisão. O “caçador de vinte flechas” ofereceu a Oxóssi vinte sacos de búzios. O “caçador das quarenta flechas” ofereceu-lhe quarenta sacos. O “caçador das cinqüenta flechas” ofereceu-lhe cinqüenta. E todos cantaram para Oxóssi. O babalaô também juntou-se a eles, cantando e batendo no seu agogô:Oxóssi! Oxóssi! Oxóssi!
(Vanda Machado )



 
Um presente pode mudar a nossa vida. Mas será que um presente pode também mudar o que somos, o nosso jeito de ser, os nossos sentimentos em relação aos outros ou, principalmente, em relação a nós mesmos?


O presente de Ossanha

O moleque fora comprado  bem novinho no mercado. Seu trabalho ia ser brincar com o filho do dono, brincar de todo jeito: jogar dama, soltar pipa, rodar arco que era uma brincadeira muito apreciada naquele tempo e de cavalinho – Ricardo montava e o moleque era montado. Saíam os dois pelo terreiro:
-    Upa, upa cavalinho, gritava Ricardo.
O dono do engenho olhava aquilo e esfregava as mãos:
-    Esse moleque foi a melhor compra que já  fiz, mulher. Olha nosso filho como está feliz!
  Vai que num domingo de manhã, estando de folga, o moleque entrou no mato para pegar passarinho. Ele pegava um pedaço de pau e passava visgo para o coitado pousar e ficar preso. Naquele domingo porém, o sol já estava no alto e nada...
-    Vou lhe ajudar, disse uma voz rouca.
Tinham explicado ao moleque que se ouvisse uma voz rouca longe de casa, tomasse cuidado. Podia ser a onça Gomes ou Quibungo, ou Ipupiara ou o João do Mato.Essas criaturas horrendas tinham lá suas razões para não gostarem de gente.
-    Quem é você? – perguntou o moleque. Mostre sua cara.
Quem apareceu foi Ossanha. Usava um cocar e um saiote de penas, mais não era índio. Sua pele era negra, quase azul. Não tinha uma perna e não tinha um olho, perdidos numa briga com Xangô.
No começo de tudo, o criador que se chama Olorum, tinha dado a cada filho uma parte do mundo. Para Ossanha deu a floresta:
-    Você cuida das plantas. Umas servem para comer, outras para fazer remédio e outras para enfeitar a casa. Quando alguém precisar, atenda.
O que fez Ossanha? Guardou as plantas só para si.
-    Está em falta, mentia quando alguém procurava.
Seu irmão Xangô quando soube, chamou Iansã que cuidava dos ventos:
-    Onde já se viu? Dê um castigo para esse egoísmo.

Iansã se aproximou como quem não quer nada, Ossanha se distraiu e ela abanou com a saia o horto particular do orixá egoísta. Foi a maior ventania! Quando acabou, as plantas tinham se espalhado pelo mundo. É por isso que Ossanha está em todo lugar que tem mato, recolhendo as plantas que Iansã espalhou.
O moleque que conhecia a história não teve medo:
-    Como é que o senhor/senhora vai me ajudar?
Senhor/senhora porque Ossanha é as duas coisas.
-    Tome esse visgo, é da nossa terra. Com ele você vai pegar o pássaro Cora , já viu um?
-    Não.
E foi o que aconteceu. O pássaro Cora era um espanto! Vinha gente de longe apreciar  o seu canto – criadores de pássaros, viajantes, naturalistas, gente de outros países, do governo, da igreja...
O pássaro do moleque aprendia o que se ensinava. Bastava assobiar uma vez perto da gaiola e ele imitava. Começaram a botar preço na maravilha. O moleque recusava. Se aceitasse, teria dinheiro para jogar na cara de seu dono e dizer:
-    Olha aqui, compro a minha liberdade e pode ficar com o troco.
Mas o moleque dizia não. Não vendo, nem troco por dinheiro do mundo. O senhor partiu para a ameaça:
-    Se não me vender esse passarinho, te arranco a pele.
O moleque sorria com o canto dos lábios.
-    Se não me vender essa porcaria, te aplico os anjinhos.
Anjinhos eram uns anéizinhos de ferro para apertar os dedos e doía como o diabo!
-    Se é uma porcaria, por que o nhô quer comprar? Era só o que ele dizia.
Quando o menino estava de castigo, o Cora não cantava.
Até que um dia, o senhor perdeu a paciência. Resolveu vender o moleque para outro senhor.
-    Vai ser bem longe daqui que não quero ver a tua cara na minha frente  e nunca mais ouvir a voz desse passarinho.
Ricardo, o filho do dono, ficou triste, ficou doente e pediu:
-    Não vende, pai. Há tempos que o escravo sou eu. Eu é que dependo dele pra tudo,  não sei mais brincar sozinho.
O pai não escutou, vendeu o moleque. O comprador veio buscá-lo a meia-noite. Ricardo estava tão triste que não teve coragem de se despedir do moleque.
-    Ele vai alegre – pensou – porque tem o Cora. Eu fico triste porque não tenho nada.
No outro dia de manhã, quando se levantou e abriu a janela, o menino Ricardo teve uma surpresa: do lado de fora tinha uma gaiola pendurada.
Assim que viu o menino, o Cora começou a cantar.
(Joel Rufino Dos Santos)

 



MAHURA - a moça trabalhadeira


 
Quando Olorum criou o universo, o céu e a terra viviam juntos e em perfeita harmonia: as gotas de chuva se juntavam às águas das cachoeiras, o vento e a brisa eram companheiros inseparáveis e propiciavam um belo espetáculo formando mosaicos de folhas secas e gravetos, os homens compartilhavam a vida e não havia distinção de credo e cor, pois todos faziam parte de uma única raça: a humana.
Um dia, a terra achou que havia chegado a hora de ter um filho e deu à luz uma bela jovem na aldeia Okulo a quem deu o nome de Mahura, que significa moça trabalhadeira.
Mahura cresceu depressa e logo desenvolveu suas aptidões: trabalhava incansavelmente e com muita disciplina. Durante o dia, cuidava dos ciclos da natureza e, quando o sol se punha, sentava-se ao chão perto de um enorme pilão que usava para triturar raízes, sementes e cascas que serviriam para fazer a tintura colorida que tingia a palha e o algodão que vestia a sua tribo.  Só que o pilão que Mahura usava era mágico e, quanto mais usado, mais crescia e, como a jovem era alimentada pelo trabalho, mais vigor empreendia na sua labuta.
Tanto o pilão cresceu que começou a machucar o céu que no início gemia baixinho; mas, não conseguindo suportar as dores causadas pela mão-de-pilão de Mahura, passou a reclamar.
- Céu, sobe mais um pouquinho! - pedia a moça.
Com isso, o céu foi se distanciando, distanciando, se tornando cada vez mais inacessível até chegar a ponto das nuvens não poderem mais brincar livremente e as gotas de chuva não conseguirem mais manter o solo úmido e fértil que foi ficando fraco e pobre. As frutas não mais brotavam nas árvores como flores em buquê e a tristeza tomou conta de tudo.
Também Mahura ficou infeliz e resolveu pedir desculpas ao céu que estava tão inatingível e não ouviu suas lamúrias. Então, a jovem resolveu ofertar um presente, retirou uma pepita dourada do leito de um rio dando-lhe o nome de Sol e, de uma caverna escura, retirou uma pedra redonda e reluzente à qual batizou de lua.
Atirou os presentes bem para o alto, um de cada lado do céu como um pedido de desculpas que aceitou as oferendas, mas preferiu ficar lá em cima, pois era mais seguro.
Assim contaram, assim lhes contei: se dúvida tiverem do causo aqui narrado, olhem à noite para o céu. As estrelas que virão brilhando nada mais são do que as cicatrizes deixadas pelo pilão de Mahura.

(Origem: Moçambique)



AGUEMON
O Mito da criação do Mundo

No principio nada existia. Existia um espaço. Olodumaré, com seu oketé de búzios, reinava soberano. Oniomon, por sua vez, perguntou curioso:
- Meu pai, está mesmo disposto a dar tudo o que eu quero?
- sim, estou - o pai falou muito tranqüilo
- eu também não quero ficar longe de você - disse o menino - mas se você puder me puder me dar um pouquinho de terra num saco, uma conquém e uma lança, eu lhe agradeço.
- é, meu pai, eu fico satisfeito - conformou Oniomon.
- e eu quero sempre acompanhar você - Omobirin repetiu, decidida.
Olodumaré abraçou o filho com alegria, depois saiu com Omobirin pelo espaço.
A terra logo começou a crescer, crescer, crescer... então ele prendeu o saquinho na cintura, pousou bem no meio da terra e soltou a conquém!
E lá foi ela ciscando e espalhando a terra preta pra todos os lados...
A terra cresceu mais ainda e a conquém não parava de ciscar...
Oniomon pisou bem forte e ficou todo contente de sentir a terra firme!
Depois, com sua lança foi marcando a terra aqui e ali...
Até que, lá pelas tantas, percebeu que ainda havia alguma coisa dentro do saco.
Ooh, Água - ele exclamou alegre.
Ele saiu caminhando, arrastando a ponta da lança no chão e a água foi rastejando atrás dele, se derramando mais ainda... seguindo o desenho que ele ia fazendo, até chegar à parte de fora da terra que está solta no espaço.
Oniomon deu uma volta completa ao redor da terra.
Então começou a observar o mundo que tinha se formado debaixo de seus pés a partir do lugar onde havia descido e a conquém tinha espalhado a terra.

Refez com os olhos atentos o caminho sinuoso das águas, e um lado a outro, até a fronteira do céu. Aí ele molhou a pontinha do dedo na água do rio, provou e disse:
- humm... que água boa! É fresca!
Depois experimentou aquela água que estava solta no espaço:
- essa é muito diferente! Hummm... Oniomon então teve a idéia de pegar bocados de terra, ir juntando e fazendo montinhos aqui e ali. Ele parava, olhava e tinha novas idéias.
Foi então que Olodumaré, do alto do seu grande espaço, decidiu chamar Aguemon, um servo muito inteligente, que estava sempre a seu lado:
- Aguemon, você que tudo vê e tudo sabe, vá à terra que dei a meu filho e veja o que ele anda fazendo. Um lindo arco-iris riscou o céu e foi por ele que Aguemon desceu até a terra.
- humm...
Aguemon saiu da água e, à medida que andava sobre a terra, seu corpo ia ficando escuro.
- Ahh, mas que beleza! Oniomon também criou pedras! Olodumaré vai gostar de saber!
Depois Aguemon se escondeu no meio das folhas e ficou todo verde. Seus olhos grandes iam reparando naquela enorme variedade de árvores e plantas que se estendia sobre a terra... Aguemon estava impressionado, quanta coisa o filho de Olodumaré plantou! Aguemon subiu um monte bem alto, ficou todo marrom e vermelho e, quando chegou ao topo, ele disse: humm... eu posso ver um grande espaço... daqui posso ver muitos lugares ao mesmo tempo... Aguemon já tinha visto o bastante.
Aguemon andou... atravessou meio mundo, até finalmente encontrar o arco-iris, que tinha uma ponta na água doce e a outra na água salgada.
Hummm... que mergulho gostoso ele deu!
Aguemon nadava de frente, de costas, se divertia nas ondas do mar...- Então eu vou pedir que você volte à terra, Aguemon. Aguemon abriu o bocão e encheu o papo.
Esperou até o outro dia e desceu novamente pelo arco-íris, dentro da água doce. Aguemon chegou de mansinho, viu que Oniomon estava dormindo, soprou para um lado e saíram insetos.
Por ultimo Aguemon soprou bem na direção da cabeça de Oniomon e finalmente saíram os sonhos...
Foi assim que o filho de Olodumaré sonhou pela primeira vez. Novos viventes que, sem ele saber, acabavam de sair da boca de Aguemon.
Aquele dia Oniomon acordou diferente e sentiu que algo havia mudado.
Oniomon meteu a mão e sentiu o frio da água na terra... era a lama!
E com lama fez uma bola, em seguida fez um monte, aí esticou para os lados e viu uma coisa plana e comprida, e modelando a lama viu quanta coisa podia...
Oniomon descobriu que a lama podia ganhar formas. Aguemon, que estava escondido vendo, foi embora contar tudo à Olodumaré.
Oniomon descobriu que a lama podia ganhar formas. Aguemon, que estava escondido vendo, foi embora contar tudo à Olodumaré.
(Carolina Cunha)


 
OMOLU
Filho de Nanã que foi criado por Iemanjá

- Mas quero apenas água e um pouco de comida, para prosseguir minha viagem. Apenas isso! – respondeu Obaluaê, ou melhor, dizendo Xapanã, nome pelo qual era chamado.
- Vá-se embora, Xapanã! Não precisamos de doença, nem de mazelas em nossa aldeia. Vá procurar água e comida em outro lugar!
E Xapanã, então foi sentar-se no alto do morro próximo. A manhã mal começara e ele ficou, sentado, envolto em palha da costa, observando a subida do sol.
Na aldeia um alvoroço se fez. Uns tinham dores na barriga, outros tinham forte dores de cabeça. Outros, ainda, arrancavam sangue da própria pele, numa coceira incontrolável. Xapanã apenas assistia…
Parecia que o tempo havia parado ao meio-dia, mas, na verdade, foram três dias de sol quente, pois a noite não chegava. Era apenas sol durante todo o tempo. E durante todo o tempo a aldeia viu-se às voltas com doenças, loucura, sede, fome, morte!
Xapanã, inerte, via tudo, imóvel…
Não agüentando mais, e vendo que Xapanã continuava do alto do pequeno morro observando, o dirigente de aldeia foi até ele suplicar perdão, atirando-se aos seus pés.
- Em nome de Olorun, perdoe-nos! Já não suportamos tanto sofrimento! Tente perdoar, por favor, Senhor Xapanã! Tente perdoar!
De súbito, Xapanã levantou-se, desceu até a aldeia e pisou na terra. Tocou na água, tornou-a também fria; tocou os alimentos e tornou-os novamente comestível; tocou a cabeça de cada um dos aldeões e curou-lhes a doença; tocou os mortos e fez voltar a vida em seus corpos.
Restaurada a normalidade, Xapanã pediu mais uma vez:
-Quero um pouco de água e alguma comida para prosseguir viagem.
Voltando-se para os aldeãos, Xapanã deu-lhes uma lição de vida.
Vivemos num só mundo. Sobre a mesma terra, debaixo do mesmo sol. Somos todos irmãos e devemos ajudar uns aos outros, para que a vida seja mantida. Dar água a quem tem sede, comida a quem tem fome é ajudar a manter a vida.